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» » » » » » REGIÃO | GEADA DE 1975 | 'Geada negra' que destruiu pés de café no Paraná completa 40 anos

Forte geada queimou o principal produto do Paraná na década de 1970.

'É uma geada que não dá para esquecer', diz cafeicultor de Londrina.

     -     por Rodrigo Saviani, do G1 PR, em Londrina publicado 18/07/2016 
Termômetros na região registraram -3,5º C no abrigo e -9º C na relva, diz engenheiro agrônomo (Foto: Arquivo/RPC)
O dia 18 de julho de 1975 não sai da memória de muitos moradores do Paraná, principalmente os que moravam no norte do estado. Uma forte geada naquela madrugada atingiu plantações da região e queimou quase todas as plantações da época. O café, principal produto agrícola do estado na época, foi dizimado.
“Eu lembro até hoje. É uma geada que não dá para esquecer", conta o agricultor Mauro Sato, de Apucarana, no norte do Paraná, que no dia 18 de julho viu a história da família ser destruída. A geada negra completa 40 anos neste sábado (18).
"Chegou a congelar a terra, formou uma camada de gelo. Bem cedinho, o café já estava preto. Normalmente a planta escure quando sai o sol, mas em 1975, o café já amanheceu escuro, preto, de madrugada já tinha queimado”, lembra Sato.
O agricultor Mauro Sato tinha 21 anos em 1975 e ajudava os pais na plantação em Apucarana, onde trabalha até hoje. Ele lembra que o desânimo foi muito grande.
“Foi difícil ver os estragos, foi um desânimo. Chegamos a chorar porque não sabíamos o que fazer. Perdemos todo o café. Então decidimos cortar todos os pés, e iniciamos o replantio. Como éramos pequenos agricultores, na época, era difícil pensar em plantar outra coisa”, relata.
O engenheiro agrônomo Francisco Barbosa Lima, que trabalhava no Instituto Brasileiro do Café (IBC) no dia da geada, recorda os efeitos daquela geada. “Os termômetros registraram -3,5º C no abrigo e -9º C na relva. Um frio sem igual que queimou os cafezais do topo à raiz”, diz Lima, que atualmente trabalha no Ministério da Agricultura.
Principal produto do estado
O café era o grande produto do Paraná, principalmente na década de 1960. Chegou ao estado a partir do norte pioneiro e se espalhou, por causa da ferrovia, até o noroeste.
De acordo com Lima, na década de 60 o estado concentrava cerca de 50% da produção nacional. Ao todo, eram 1,8 milhão de hectares de café, com uma média de 20 milhões de sacas colhidas.
Em 1975, o produto já tinha perdido terreno. Novas leis e a chegada do trigo e da soja fizeram famílias buscarem outros caminhos. “Ainda assim, era a principal cultura. Tínhamos mais de 1 milhão de hectares com café”, lembra o engenheiro agrônomo.
A geada daquele 18 de julho castigou toda a produção do estado. “Não sobrou nada. No ano seguinte, o número de sacas colhidas foi zero”, recorda Lima. Em um ano, 300 mil hectares de café foram erradicados, segundo levantamento feito pelo próprio IBC na época.
“Foi catastrófico para o Paraná e para os cafeicultores, em especial. Afetou muito a economia e a parte emocional dos produtores, porque eles só tinham as plantações de café”, explica Paulo Sérgio Franzini, secretário-executivo da Câmara Setorial do Café do Paraná.
Franzini explica que há dois tipos de geada. A geada branca é quando há formação de gelo sobre a planta. Já a geada negra é causada pela soma das baixas temperaturas com o vento. "Naquele dia, tivemos os dois tipos de geada. Atingiu tanto as plantações que ficavam nas partes mais baixas quanto as das partes altas", conta.
Pés de café amanheceram queimados por causa da geada (Foto: Arquivo/RPC)Pés de café amanheceram queimados por causa
da geada (Foto: Arquivo/RPC)
'Foi terrível', lembra cafeicultor
O cafeicultor Geraldo Grecco, 85 anos, também guarda na memória o amanhecer daquele 18 de julho de 1975. Mesmo 40 depois, ele se emociona ao se lembrar do que viu.
“Foi terrível. Você deitou com as lavouras tudo verde e, no clarear do dia, de 8h, 9h, começou a ficar marrom e queimou tudo. Não salvou nada. Perdi tudo. Era tanto gelo que você andava na terra e aquilo estralava no calçado”, relata o produtor que ainda planta café em Londrina, no norte do estado.
Grecco conta que tinha mais de 90 mil pés de café. Só foi salvo o que já tinha dado fruto. “O pouco produto colhido foi vendido e acabou rendendo. Porém, no ano seguinte, não tinha nada”, diz.
O agricultor lembra que o recomeço foi muito difícil. “Teve que cortar no tronco. Quem teve coragem cortou, que não teve abandonou, arrancou, fez qualquer coisa. Não tem como falar. É uma decepção imensa. Você cuida o ano inteiro, tratando e, dentro de meia hora, queima e não tem mais recuperação”, conta.
Maior parte da produção de café do Paraná está concentrada no norte do estado (Foto: Vinicius Frigeri/RPC)Maior parte da produção de café do Paraná está concentrada no norte do estado (Foto: Vinicius Frigeri/RPC)
Atualmente, 53 mil hectares
Quarenta anos depois, o café já não é a principal cultura na agricultura do Paraná. Atualmente, segundo o Departamento de Economia Rural (Deral), da Secretaria de Agricultura e do Abastecimento do Estado (Seab), são 53 mil hectares do produto no estado.
De acordo com Franzini, a maior parte das plantações está concentrada no norte do estado, principalmente no norte pioneiro. “O café hoje é uma atividade de pequenos produtores. É uma atividade muito importante na diversificação da pequena propriedade”, diz. Sobre o futuro do café, o economista vê potencial no estado para aumentar a produção, com o uso da tecnologia. “É uma combinação do produtor investindo em tecnologia, pesquisa para o desenvolvimento da atividade, e a assistência técnica presente, além da vontade do produtor. O cafeicultor não perdeu a vontade. Ele herdou essa vontade lá do passado e continua com essa expectativa”, destaca Franzini.“Hoje, em termos econômicos, há um equilíbrio melhor do que havia lá no passado. Com o modelo do sistema mais adensado, e agora mecanizado, o produtor pode reduzir o custo de produção, pode se tornar competitivo no mercado, mesmo em um período de preço baixo”, comenta.
Paraná foi o maior produtor de café do Brasil na década de 1960 (Foto: Reprodução/RPC)Paraná foi o maior produtor de café do Brasil na década de 1960 (Foto: Reprodução/RPC)
'Filhos do Café'
Um documentário produzido pela RPC em 1980, chamado "Filhos do Café", destacou os efeitos da geada negra no norte do Paraná, principalmente na região de Londrina. A cidade, conhecida como "Capital do Café", concentrava as maiores negociações envolvendo o produto, tanto para o Brasil quanto para o exterior.
Dividido em três partes, Filhos do Café conta a formação das cidades do norte do Paraná, o café como principal atração para a colonização, a geada negra e os impactos econômicos, e as mudanças no trabalho e no desenvolvimento da região.
Filhos do Café - parte 1
Filhos do Café - parte 2
Filhos do Café - última parte

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